Carta aberta a um jovem que pensa em vocação. "Antes que eu te formaste dentro do ventre de sua mãe, antes que tu nascesse te conhecia, te consagrei", Deus nos chama. Muitos jovens ainda estão inquietos com sua vocação. O chamado é nítido, mas nem sempre a resposta é fácil. Veja esta carta enviada por um jovem a um padre. Clique no tópico pra ver na íntegra.
Ontem recebi uma carta, quantas perguntas!... Quantas inquietações!...
Sei que sua geração coloca muitas dificuldades à questão vocacional, a ponto de torná-la um bicho-de-sete-cabeças... O que não é verdade.
Vibrei de felicidade ao ler aquele parágrafo onde você afirma: “A pessoa, a mensagem e o modo de ser de Jesus Cristo me atraem profundamente”; e depois “Não quero ser um cara importante dentro da sociedade, como alguém que tem status. Mas quero, isso sim, realizar um papel significativo”. Realmente você tem toda razão.
Percebo em você uma grande vontade de viver, uma capacidade de sonhar com um mundo melhor e um desejo de viver com autenticidade a sua fé. Por isso, eu me pergunto: O que ainda lhe falta para decidir sua vocação?
Certo dia – lembro-me muito bem – você ficou empolgado ao conhecer um melhor amigo meu e me sussurrou: “Sabe, eu gostaria de ser um ‘cara’ como esse padre!” Eu não lhe disse nada, mas pensei com meus botões: Porque será que ele não disse que gostaria de ser um padre como esse “cara”? O que ainda lhe falta?
É verdade que para brotar a vocação religiosa e/ou sacerdotal não bastam fé e o trabalho na evangelização. É necessário ainda que alguém o chame em nome da comunidade. Isso é o que eu gostaria de fazer, hoje: Convidá-lo a pensar em coisas serias.
Estou certo de que as grandes aspirações do jovem de hoje, e que se refletem no seu coração, estão próximas do que entendemos por vocação. Confira: O jovem de hoje contesta a sociedade consumista que cria “necessidades desnecessárias”, marginalizando a grande maioria da população que passa “necessidade necessárias”. O mundo consumista precisa ser contestado. Todo aquele que se entrega totalmente a Deus, no serviço dos irmãos – padre – religioso, religiosa, leigo consagrado – assume, através das suas palavras e gestos, a posição de resistência positiva ao consumismo selvagem. O jovem de hoje também se rebela contra o relacionamento social voltado aos interesses pessoais egoístas, que destrói a possibilidade de uma autentica amizade. A pessoa consagrada a Deus experimenta um sentido de gratuidade que a coloca numa posição singular em relação à grande maioria. O consagrado é alguém que vive o serviço aos outros sem esperar nada em troca. O consagrado a Deus coloca-se à disposição de todos, especialmente dos mais pobres e necessitados, fazendo da própria vida um testemunho do amor gratuito de Deus pela humanidade.
Você me disse que se espanta diante de tanta violência e injustiça que dominam à sua volta, pois já provou as conseqüenciais. Então, porque não se tornar um “criador de solidariedade” dentro desse mundo conflitivo? Tentar construir um mundo de irmãos, sem senhores e sem escravos, onde todos se coloquem a serviço de todos! Eis que você poderia realizar já, se decidisse vivera própria vida de modo diferente.
Você já percebeu que a maioria dos jovens caminham sem rumo, sem objetivo? Brincam com a morte! Brincam com a vida! Alguns até se perderam para sempre no enorme labirinto construído pela própria loucura. Outros tem meios econômicos, mas carecem de motivações verdadeiras e adequadas que dêem sentido à vida. A proposta evangélica possui garra suficiente para encher de ânimo, esperança e alegria o coração do homem. O sentido mais profundo da vida consiste em dar sentido à vida do outro. Você não gostaria se de juntar aos que assumiram radicalmente esse compromisso?
A ciência e a técnica exercem tal fascínio nos homens do nosso tempo a ponto de deixá-lo como que hipnotizados. Veja como as pessoas se prendem às coisas que criam! Neste mundo robotizado e carente de valores, os consagrados a Deus são chamados a anunciar e testemunhar a primazia da pessoa sobre as coisas, a generosidade, a doação sincera e alegre, a abnegação solidária, a autenticidade, a paz, a justiça e a honradez. Quem vive a “aventura” do Evangelho contribui decisivamente para a plena libertação dos homens. Você se anima aser um desses?
“Por que um jovem ou uma jovem decidem ser sacerdotes ou religiosos?”, você me pergunta. E eu lhe respondo: um jovem faz essa opção por causa de uma experiência pessoal e profunda de Jesus. O consagrado a Deus é alguém que deseja seguir o Senhor com todo seu ser, com todas as suas energias, colocando-se como instrumento da libertação que Deus realiza no mundo através da Igreja.
“Custa-me muito largar o meu povo, minha gente”, você diz. Pois saiba que a resposta generosa ao chamado de Deus não tira ninguém do mundo, mas o coloca de uma nova maneira no meio do mundo. O amor ao seu povo está intimamente unido ao amor de Jesus. Esses dois amores sustentam a vida do consagrado a Deus. Uma forte vontade de viver é condição indispensável para que um jovem saia pelo mundo vestindo a camisa de Jesus e levantando a sua bandeira. “Eu sou a vida”, disse Ele. E só quem segue verdadeiramente pode viver a VIDA em plenitude. O que diferencia um sacerdote ou um religioso de um leigo não é o amor a vida ou ao seu povo, o que verdadeiramente difere é a maneira concreta de servir a essa vida, a esse povo! Você concorda comigo?
É claro que não é fácil decidir-se pela vida consagrada. Deve-se, primeiramente discernir ao atrativos e os medos inerentes a toda tomada de posição séria. Pode estar certo de quem ninguém é chamado a determinada vocação se não sentir uma certa atração por ela. Jesus não obriga ninguém. Somente quem experimentou dentro de si o forte gosto do Espírito poderá e será capaz de trilhar com alegria esse caminho.
E o celibato é muito difícil? A nossa sociedade, erotizada em grau extremo, não acredita no nosso celibato e insiste em garantir que se trata de uma utopia. Mas não é bem assim. Sejamos sinceros. Conhecemos muita gente que renuncia à alegria de ser esposo e pai, para se tornar irmãos e amigo de muitos e tenta amar a todos no Senhor. Sim, certamente o celibato não só é possível, mas um bem para muitos jovens do nosso tempo. Quem descobre Deus como único absoluto da sua vida é capaz de experimentar uma grande liberdade interior que destrói a idolatria do “deus do sexo”, e desmonta a obsessão sexual criada e sustentada pela propaganda consumista. O celibatário fez de Deus seu único absolto, e portanto, tudo o mais é relativo. Ser celibatário significa assumir um modo silencioso e eloqüente de contestação do ídolo sexual. O religioso proclama com a própria vida a existência de algo que alguém que são maiores e mais importantes que o valor do sexo: O Reino de Deus e a pessoa de Jesus Cristo. Só Deus é absoluto!
Finalmente você me pergunta se é difícil consagrar-se a Deus hoje. Honestamente, creio que antes desta pergunta é preciso responder outra: Você que ser cristão pra valer? Sim ou Não ? Não acha que por trás dos possíveis medos de se tornar um religioso futuramente esconde-se o grande medo de ser um bom cristão, hoje?
Muitos jovens cristãos como você deveriam refletir um pouco mais sobre essas questões. Aparentemente é mais fácil e tranqüilizador dizer: “Padre? Irmã? Eu não sou pra isso”. Mas será que a resposta verdadeira não seria: “ Eu não quero isso?”. Sejamos honestos! Como alguém poderia ser um bom cristão e o mesmo tempo não estar disposto a se entregar inteiramente? Somente quem decide ser um cristão pra valer, terá possibilidades de ser um religioso um dia. Você não acha?
Hoje, mais do que nunca, são necessários os valores do Evangelho: Fraternidade, justiça, liberdade, amor, sentido da vida, esperança. E nós, padres, religiosas, queremos vivê-los no meio do nosso povo, e você, por que não?
O Profeta
VOCAÇÃO HUMANA X VOCAÇÃO DIVINA
É bom deixar bem claro, há a vocação humana e a vocação divina. A vocação humana é aquela em que a pessoa se sente feliz e realizada: em ser médico, advogado, professor, lavrador, mecânico... etc. Trabalha naquilo, por que gosta. Se a pessoa precisa trabalhar naquilo, mas não gosta, dizemos que ela não tem aquela vocação.
Mas mesmo assim, esta vocação é diferente da vocação divina, onde a pessoa, ao escolher ser padre, religioso, ou religiosa, escolhe aquilo porque gosta e se sente feliz. Então, qual é a diferença? A diferença é que na vocação humana, você faz aquilo e espera o salário, a recompensa merecedora por aquilo em que você se esforçou. Na vocação divina, você faz puramente por amor. Faz por um amor desinteressado, que sai de dentro do coração, da alma, e produz uma paz verdadeira, porque provêm do cumprimento da vontade de Deus. Podemos, então dizer que este é um amor-doação.
"Assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: Somos servos inúteis; fizemos somente o que devíamos fazer." (Lc 17, 10)
No Reino de Deus não se trabalha para alcançar prêmios na terra, mas no Céu. Santa Teresinha do Menino Jesus dizia: "A nós o trabalho, a Jesus o sucesso!"
Esse é o motivo pelo qual vocação divina não é profissão, onde, se você não gosta, reclama, não trabalha direito, ou até mesmo, se possível deixa o emprego.
Mas, na vocação divina se uma pessoa já assumiu perante Deus, aquele compromisso, ela deve ir até o fim, sem desanimar com o peso da Cruz, nem em querer ser elogiado pelo que fez. E isto não vale somente para a vida religiosa consagrada, mas também para o casamento.
É muito freqüente ouvir-se em Curso de noivos, que não se deve pensar em casar só para ser feliz, mas para fazer o outro feliz. Se você casou para ser feliz, você não compreendeu o sentido do casamento, você deve querer fazer a felicidade daquela pessoa que você ama, e assim você será feliz! Já pensou se todos os casados tivessem este pensamento, como não seriam diferentes os casamentos?
Depois das curas e milagres, Jesus não esperava os aplausos, Ele cumpria a Vontade do Pai saindo despercebido antes de ser aclamado:
"O que havia sido curado, porém, não sabia quem era, porque Jesus havia se retirado da multidão que estava naquele lugar."(Jo 5, 13)
"À vista desse milagre de Jesus, aquela gente dizia: 'Este é verdadeiramente o profeta que há de vir ao mundo. Jesus percebendo que queriam arrebatá-Lo e fazê-Lo rei, tornou a retirar-Se sozinho para o monte." (Jo 6, 14 - 15)
"Espalhava-se mais e mais a Sua fama e corriam grandes multidões para o ouvir e ser curadas das suas enfermidades, mas Ele costumava retirar-Se a lugares solitários para orar." (Lc 5, 15- 16)
A vocação divina é diferente da vocação humana, pois não se trata de uma profissão, mas de um estado de vida. Deve ser uma doação, livre, consciente, madura, por amor a Deus e ao próximo.
Se para toda decisão de nossa vida, devemos ser sensatos, quanto mais uma decisão que levará a um estado de vida definitivo.